outubro 25, 2011

Let the right one in – Thomas Alfredson

(pedindo licença às franguinhas)
Que Crepúsculo, que nada!

Sim, mais uma história de vampiro que se apaixona por um humano e vice-versa, porém, por mais que esta seja anterior aos contos românticos de Meyer e, também, por mais que eu tenha-a assistido somente depois de todo o furor adolescêncio do romance de Edward e Bella, o presente filme me provou duas coisas:



a)      Histórias de vampiros humanizados não precisam ser ruins;
b)      Quando um tema, mote, formato é bom, não importa que você tenha experienciado o mesmo formato em uma qualidade “duvidosa” antes, pois quando você se deparar com um trabalho melhor (no sentido-pessoal-de-cada-um de melhor, vale enfatizar) você poderá fruí-lo e até mesmo emocionar-se.

A história é baseada no romance homônimo (Låt den rätte komma in) do sueco John Ajvide Lindqvist de 2004 e conta a história do envolvimento entre Oskar, 12 anos, vítima de bullying, pais separados – interessante como nos acostumamos a imaginar que esses detalhes “dizem” alguma coisa sobre a personalidade das personagens – e Eli, que diz ter 12 anos, diz morar com o pai e diz que não pode nem ser amiga de Oskar. Por fim, descobre-se que Eli, na verdade, é uma vampira (Tãn-dãn!)

A atmosfera do filme é erma e deserta, e a diegese se dá a passos lentos, quase como se o tempo estivesse congelando – o filme é ambientado em uma cidade entupida de neve. A trilha sonora quase não existe; o silêncio proporciona mais calafrios do que ver Eli, em roupas tão finas e sem sapatos, caminhando sobre a neve.

Eu mato para sobreviver. Você, se pudesse, mataria por vingança!”, uma sentença de Eli para Oskar que, talvez, resuma bem o que histórias de híbridos, em geral, pretendem tratar: Afinal, o que é SER humano?

Eli, quando mata, fica com os olhos assustados e um sinal de cansaço e erro corta seu rosto; Oskar, ao vingar-se pela primeira vez de seus agressores, e ao ver o sangue escorrendo da orelha de seu inimigo, ri, esnobe e satisfeitamente.

Momento cuti-cuti, depois que ela dacapita e desmembra uma pessoa
Não sei! Não sei se é por que os vampiros nesse filme pegam fogo, de verdade, ao contato com o Sol, não sei se é por que a Eli bebe sangue “de gente mesmo”, ou por que a cena onde há a mais bela demonstração de amor de Eli para Oskar é a que ela decapita e desmembra um dos agressores de Oskar. Só sei que prefiro-o, à saga do sem-bochecha-cara-pálida e da sem-graça-cara-de-menstruada.

outubro 20, 2011

White Limo - Foo Fighters

E eu que pensei em abandonar o blog, volto, por um motivo quase nada importante, mas de registro necessário, sendo este o primeiro ano da segunda década do século XXI. Algo me chamou a atenção no clipe de White Limo, dos Foo Fighters – (música que faz parte de um CD que, a princípio, não parecia merecer honrosos e exagerados comentários.

Depois de passados dez anos da virada do século (e termos sido ameaçados por mais de dezenas de finais-de-mundo, cientificamente previstos e confirmados), década na qual vimos a moda, a música, as artes plásticas e literárias enfatizar suas produções em pastiches, paródias e releituras do passado. Para ser mais exato (excluindo a literatura que possui um tempo diferente) os anos 70 e 90 do século passado foram-nos escancarados na TV, nos cinemas, nas exibições de arte e nas boates e bares.

Vimos de tudo, a moda do sem-sutiã e da calça-boca-de-sino, o retorno do vinil, releituras cinematográficas de quadrinhos, o renascimento de John, Paul, George e Ringo, de Michael Jackson e Madona, de Mamonas Assassinas e RPM – RPM, diga-se de passagem, mais de uma vez.

O que particularmente me chamou atenção no clipe de White Limo (e na música em si) é um retorno ao passado, mas não aos heavy metals ou rumbas, porém, ao grunge dos anos 90.

A estética do clipe também pertence dessa década. Os patins, o walkman e a fita cassete, a limosine, shorts curtíssimos, botas country e maconha, todos são elementos diegéticos constituintes do clipe que remontam tal época (sem contar a explosão manjadérrima do final...).


Zoons rápidos, falhas na captação da luz, hora e data na filmagem (famosíssimas, graças as vídeo cassetadas do Faustão) e grande quantidade de montagens em takes curtos, entre outros recursos de filmagem.

White Limo não é a primeira produção artística-cultural a resgatar alguma característica dos anos 90, porém é a que mais se expôs assim. Gostei do clipe, gosto Ca da vez mais do CD.

fevereiro 28, 2011

Cisne Negro


De várias maneiras eu poderia falar do filme e de diversas dimensões de análises (psicológica, literária, cinematográfica), no entanto, vou preferir a me ater com dois aspectos que me são mais caros: a análise comparatista e a metalinguagem dentro do filme.

O que, no frigir dos ovos, caracterizam um discurso de uma faceta só: comparar o Cisne Negro (2010) com o balé clássico homônimo, ou com as várias e anteriores adaptações do mesmo – até mesmo, dentro do anime Cavaleiros do Zodíaco – é expor o aspecto principal da atual adaptação (pelo menos, o que mais chamou atenção) da narrativa que conta a si própria.

Se eu me reter a atuação dos atores, da construção dos personagens, das minúcias do enredo, meu texto vai se tornar enfadonho, mas temo que, a não fazê-lo, o que descrevo possa parecer depreciativo. Porém, já de alertas dados, encabecemos: a história do filme, “o final do filme” é entregado desde as primeiras cenas. O diretor não só aponta o desfecho, ou expõe-nos pequenos vislumbres: ele ‘conta’, com palavras.

Thomas Leroy (Vincent Cassel), após escolher os dançarinos, fala que fará “a sua versão do Cisne Negro”. É nele, no diretor personagem, que o diretor do filme (Darren Aronofsky) decide falar aos espectadores. Vejam que, no enredo, não dança-se exatamente “uma versão” do Cisne Negro; não há indicações de que o enredo do balé sofrerá modificações, para que então possa-se considerar uma versão: o filme, em si, é que é uma versão do aclamado balé. O filme, como um todo, é a versão do Cisne Negro da qual fala o personagem de Cassel.

Thomas nos avisa que Nina (Natalie Portman) é perfeita para o papel do Cisne Branco, mas não de sua irmã gêmea, mesmo assim, a escolhe para o papel. E é ele quem a submete à tarefa de tirar de dentro de si o Cisne Negro e a ensina como fazê-lo, a induz à fazê-lo, a pressiona (inclusive com a escolha para substituta, sua Lily): a eterna iluminação da sapiência e do caráter divino do diretor – do autor.

Desesperado, com o dia da apresentação chegando, Thomas se torna mais radical e alerta a Nina: “O seu único obstáculo é você mesma”. Ele não quer mais simplesmente resgatar o Cisne Negro, mas exorcizar o Branco, matá-lo: o diretor do filme, pela voz do diretor do balé, avisa-nos do fim de Nina.

O cume dessa trama, não é a cena da morte do Cisne Branco no balé (e de Nina) – o fim do filme. Porém, muito antes no florescer do Cisne Negro e no beijo, depois da dança, adivinhem em quem: no diretor. O sinal de agradecimento e paixão serviçal por aquele que a salvou da torre em que estava presa, do corpo didático de Nina, do dragão que a impedia de bater suas asas, da decência, da disciplina. Toda história de amor tem um príncipe encantado e todo filme é uma história de amor: o príncipe de Cisne Negro é a figura shamânica do diretor.

No mais, brilhante e impecável atuação de Portman, merecido Oscar – apesar de não confiar muito nessas premiações de gala onde pessoas manipulam grandes espetáculos para bem-dizer a si próprias, criando a impressão que quem louva somos nós, aleluia, aleluia.

janeiro 21, 2011

A Obscena Senhora D - Hilda Hilst

“que cê disse, menino?
o que você ouviu: um susto que adquiriu compreensão, isso era Hillé.” 
(HILST, p. 89)



Das lendas que correm sobre as insaciáveis mulheres de Jorge Amado em sua literatura, nenhuma das que ouvi dizer – pois sendo que nunca li – foi capaz de equiparar-se a sede de descoberta, de vontade de saber, quase carnal – de quem quer saber, mas não só saber; sentir que sabe, no sangue, nas entranhas – sede sexual de compreender, de Hillé, a obscena senhora D: D de Derrelição, desamparo, abandono. Não há o que equiparar-se, talvez, pois não se pode comparar literaturas a níveis ou processos cumulativos de mais ou menos. O que quis inferir no tocante a comparação foi da minha própria excitação intensa e erigida ao beber das palavras de Hilda.

As pernas que se abriam para o sorver de Ehud, para o sexo de Ehud, eram as próprias páginas do livro aberto – dilata-se as pupilas e os poros, oros, orifícios; as pernas que se abriam tinham uma mente já tão escancarada que de tudo duvidava e enquanto tentava entender o próprio compreender, deixava-se foder por Ehud, ele, incapaz de responder-lhe, pois quem poderia,se Hillé ainda procurava a pergunta. Mas não passava mais de que uma (das várias) lembranças: Ehud já morrera, há alguns anos, por volta dos 60/70 anos, e Hillé era apenas uma velha que vivia, já desde antes da morte do marido, ao pé da escada e lá, procurava, sem saber o que, mas procurava.

A Obscena Senhora D narra, rapidamente – pouco mais de oitenta páginas – a trajetória de uma mulher, solitária, que decidira isolar-se do mundo, das convenções, mas sem desaparecer do mundo (o que com certeza, gera incomodações daqueles que querem a vida retilínea e objetiva de convencionalidades e a odiavam, os vizinhos); uma mulher que de tão inteligente desiste de conceder toda e qualquer idéia: “Hillé, andam estranhando o teu jeito de olhar / que jeito? / você sabe / é que não compreendo / não compreende o quê? / não compreendo o olho, e tento chegar perto.” (p. 21).

A natureza forte e questionadora de Hillé, provoca em nós, seus leitores, o próprio desejo de se perguntar, mas como não sofremos como ela (ou talvez, muito pelo contrário, sofremos, diferentemente dela) as indagações da Senhora D soam como ferinas ironias, desmistificadoras, anti-sacras: “Ai, Senhor, tu tens igual a nós o fétido buraco?” (p. 45). E se, então, deus possuísse cu? lá atrás dele, comprimido escondido, podre? Orgulharíamo-nos, ainda, de nossa posição na política, na sociedade, no “pálido ponto azul”, de sermos o espirro sujo “desse” deus?

Excelente leitura e instantânea ,até, para aqueles que como Ehud, sentem sede de Hillé, de seus grandes e ainda firmes seios ou de suas dúvidas – que no frigir dos ovos, dependerá na verdade da sede de cada um.

janeiro 20, 2011

Declaration of Dependence - Kings Of Convenience

Kings of Convenience é tudo que o próprio nome sugere. Sabe aquela expressão “Feios, bobos e chatos” – me sinto tão ‘parte-de-alguma-coisa’ quando a leio – pois é. Na verdade, KOC (para os íntimos) é um garrafal, mas sem preenchimento ‘POIS É’. Simples, mas que impressiona por se propor tão incomumente normal.

Erlend Øye e Eirik Glambek Bøe (nem me perguntem como falar esse ‘o’ cortado. Pra mim isso é “conjunto vazio” em matemática) são a prova de que a Irlanda tem muito mais a oferecer que apenas James Joyce e U2 – e Samuel Beckett. Seu último disco segue mais ou menos a linha dos anteriores: músicas acústicas que nos movem, sem nos pressionar ou forçar, com mãos macias, à poltrona mais próxima, à cama mais fresca, ao canto mais frio e cinza da casa.

Não que sejam (apenas) músicas tristes, mas com seu tom tão suspirado, nos levam suavemente a reflexão e as músicas em si, são pequenas epifanias, pequenas revelações cotidianas. Os títulos de seus álbuns são sempre marcados por um traço quase óbvio e de repente estranho: Calmaria é o novo Barulho (2001), Confusão em uma rua vazia (2004) e, o mais recente, Declaração de Dependência (2009) – traduções minhas.

O último  – Declaration of Dependence – é um misto de bossa-folk. Algumas poucas melodias nos convidam a trancar a cara e escutar, outras já parecem feitas e gravadas em take único, depois de uma xícara de capuccino, como quem diz “ei, aquela lá, lembra? Começa assim...” e assim são Boat Behind, Rule My World e Peacetime Resistance. Assim também é Mrs Cold (segue o vídeo abaixo): “Quando eu posso ter? Quando eu posso ver? Você sabe que fica vulnerável perto de mim” (tradução minha).

A docilidade das vozes de ambos muitas vezes contrasta com o tom ferino de algumas composições, mas, é claro, isso também já faz parte do estilo do ‘duo acústico’ irlandês, como que o conteúdo dos CDs tentasse rimar com o título dos álbuns. E rima.

O Hobbit - J. R. R. Tolkien

Finalmente, viajando pela literatura nerd que deixei de lado durante minha formação em letras e mesmo a escolar, me aventurei por Tolkien. E não deixem-se enganar pela hipérbole comum do vocábulo aventura, pois uso-o no seu sentido literal.

Por mais que belas palavras possam parecer enganar pelo tom – o tom, na verdade, é quem nos engana – e, por isso, exija-se do leitor uma atenção especial, minimiza-se essa atenção na leitura de O Hobbit, não por ser uma escrita de “baixa qualidade” e sim pelo estilo do autor: Tolkien sempre tenta deixar tudo claro e bem explicado, nos chamando atenção tantas vezes durante a narrativa para certo detalhe do temperamento de determinada espécie, a fala de determinada região, o apego de determinados sujeitos, para que fique claro também o sentido de certas reações como a radicalidade e imprevisão de outras.

Trata-se de uma aventura e com um desfecho até certo ponto inesperado (caráter das melhores aventuras) de um hobbit, uma espécime que existiu na Terra Média, muito miúdo – pouco menor que um anão – e meio que parecida com esse que vos escreve: caseira, aversa a longas caminhadas e amante de uma vida simples e objetiva em sua casa. Acontece que, por possuir em seu sangue descendência de uma raça hobbit aventureira,os Tuk, é lançado na viagem para recuperar o ouro de anões amigos de Gandalf – sim, “o” Gandalf.

Claro que, apesar de ter gostado muito, não pude fechar meus olhos à constante caracterização biológica hereditária que há dentro do livro e que revela aspectos – hoje, preconceituosos – da época em que foi escrito, mas usados de uma maneira tão mais “saudável” que em nada é capaz de tirar o brilhantismo do criador de um mundo complexo e de seres complexos.

O livro é um feriado para o leitor: rápido, divertido, fácil de ler, mas não adianta começar a folhear suas páginas sem o mínimo de imaginação. A Floresta das Trevas não ganha vida apenas com as reclamações de fome e cansaço do pequeno Bilbo, nem a frieza assassina de Smaug realça-se sem um leve olhar cruel as páginas em que ele se encontra.

Por fim: o filme já está vindo aí, em duas partes. A primeira poderemos assistir em 2012.

janeiro 08, 2011

Heima - Sigur Rós

Lembra de, na infância – claro, para aqueles que nasceram em 80 e foram crianças em 90 – ter ouvido falar de uma banda cujo o cantor tocava guitarra com um bastão de violino? Eu falo na infância, pois, enquanto esperávamos o Castelo Ratimbum ou o X, ou o Doug começar na TV Cultura, muitas vezes um programa musical podia estar passando e foi lá que ouvi falar, pela primeira vez, de Sigur Rós.

Apenas no ano de 2010 é que tive a nostalgia de, em uma comunidade do Orkut chamada “Masoquistas Musicais”, me deparar com a banda que, pra mim, já não passava mais de que um sonho de menino.

Sim, Sigur Rós é uma banda para aqueles de coração partido. Suas músicas não exigem sua voz, – a não ser que você fale islandês – seus aplausos, seus isqueiros acesos; nada além de um bom e jovem coração doente por paz, a paz que você nem sabia que buscava, pela paz dos acordes de Hoppipolla, Glosóli ou Ára bátur.

Esse filme mostra uma turnê gratuita que a banda fez, após a turnê mundial do álbum Takk, pelo seu país, a Islândia. Podemos conhecer um Sigur Rós caseiro, brincalhão, mas também mais profundo, preocupado com seus ‘irmãos’: Heima, nome do documentário, significa lar em islandês.

Descobrimos o nada que existe na Islândia e temos inveja dele. Desejamos que, também, pudéssemos ter nada, ser nada, nada além de música, uma xícara de algo quente para uma barriga cheia, um bom vento e algumas pipas. Àqueles que não precisam ‘decodificar’ o que escutam para entender, uma boa opção é ouvir essa banda que foi precursora do estilo que consagrou bandas como Radiohead.